Introdução

Entre tantos desafios que o Brasil enfrenta para se desenvolver, um dos mais graves – e muitas vezes esquecidos – é o saneamento básico. Em pleno ano de 2025, quase 17% da população ainda não tem acesso à água potável e quase metade (44,8%) não conta com coleta de esgoto. Esses números, do Ranking do Saneamento 2025, do Instituto Trata Brasil, mostram uma realidade dura: milhões de brasileiros ainda vivem sem o mínimo para uma vida saudável e digna.

Por que isso é um problema tão sério?

A falta de saneamento não é só um problema de infraestrutura. Ela gera:

Doenças evitáveis como diarreia, dengue e verminoses;

Mais internações hospitalares, que pesam no orçamento da saúde pública;

Evasão escolar, já que crianças ficam doentes e faltam às aulas;

Queda de produtividade no trabalho;

Desvalorização dos imóveis e das cidades.

Ou seja, sem saneamento, não há saúde, educação, qualidade de vida nem desenvolvimento econômico.

O Marco Legal do Saneamento

Em julho de 2020, foi aprovada a Lei nº 14.026/2020, conhecida como Novo Marco Legal do Saneamento. Ela trouxe metas claras:

Até 31 de dezembro de 2033, todos os brasileiros devem ter acesso à água potável e ao esgoto tratado.

Empresas privadas podem concorrer em licitações para ajudar na expansão dos serviços.

Foram fixadas metas de desempenho para os prestadores de serviços.

De lá para cá, o número de municípios atendidos por empresas privadas saltou de 291 em 2019 para 1.793 em 2025. Porém, mesmo com avanços, ainda estamos longe de alcançar a universalização no prazo. Mantido o ritmo atual, o Brasil só atingirá a meta em 2070 – quase 40 anos de atraso.

Onde estão os principais problemas?

Diferenças regionais:

Cidades como Campinas, Jundiaí e Maringá já estão próximas da universalização.

No Norte, capitais como Porto Velho e Macapá ainda têm menos de 55% de cobertura de água.

Tratamento de esgoto:

Só cinco capitais tratam mais de 80% do esgoto (Curitiba, Brasília, Boa Vista, Rio de Janeiro e Salvador).

Outras quatro capitais tratam menos de 20% (Porto Velho, Macapá, São Luís e Teresina).

Regionalização mal estruturada:

A lei prevê agrupar municípios em blocos para dar viabilidade financeira.

Na prática, há entraves políticos e falta de coordenação entre estados e municípios.

Agências reguladoras frágeis:

A ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico) deveria coordenar a regulação, mas enfrenta falta de estrutura e interferências políticas.

Muitos órgãos locais têm baixa autonomia e pouca capacidade de fiscalização.

Financiamento insuficiente:

Seriam necessários R$ 45 bilhões por ano até 2033.

Hoje o Brasil investe cerca da metade disso.

Resultado: todos os dias, despejamos em rios e lagos o equivalente a 5.500 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento.

Exemplos que mostram que é possível

Apesar dos entraves, alguns municípios e capitais conseguiram avançar. Eles provaram que com:

Planejamento,

Investimento adequado,

Boa governança,

Regulação firme,

E vontade política,

o saneamento pode se transformar em realidade para todos.

Conclusão

O Brasil não pode mais tratar o saneamento como um tema invisível. Ele precisa ser prioridade nacional. Não é apenas sobre cumprir metas da lei, mas sobre garantir um direito básico de cidadania: viver com dignidade.

Sem água tratada e coleta de esgoto, não é possível falar em saúde, educação, habitação ou desenvolvimento.
O tempo da omissão acabou: é hora de transformar exceções em regra.

CAROLINE GUALTIERI e JOÃO COSTA
Consultores em Gestão Pública