1. Introdução
A Emenda Constitucional nº 132/2023 remodelou o sistema tributário nacional. Pela primeira vez em mais de 50 anos, alterou profundamente a tributação sobre o consumo, impactando diretamente os Municípios brasileiros.
A ACGP – Assessoria e Consultoria em Gestão Pública preparou este material para auxiliar gestores públicos a compreender as mudanças, avaliar riscos e oportunidades, e definir estratégias concretas de adaptação.
2. Fundamentos constitucionais da Reforma
2.1. Princípios norteadores (EC 132/23, arts. 146-A e ss. da CF/88)
A reforma introduziu expressamente os seguintes princípios:
Simplicidade (art. 146-A, I) → sistema claro, uniforme e acessível.
Neutralidade (art. 146-A, II) → a tributação não pode distorcer decisões de consumo ou investimento.
Transparência (art. 146-A, III) → clareza sobre quem paga e para onde vai o tributo.
Cooperação federativa (art. 146-A, IV) → União, Estados e Municípios devem atuar de forma coordenada.
Defesa do meio ambiente (art. 146-A, V) → incentivo a práticas sustentáveis.
⚖️ Base legal: arts. 145 a 162 da CF/88, com redação da EC 132/23.
3. O novo desenho da tributação sobre consumo
3.1. IBS e CBS substituem ISS, ICMS, PIS e Cofins
IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) – competência compartilhada entre Estados e Municípios.
CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) – competência da União.
Base ampla, não cumulativa, alíquota uniforme (art. 156-A e 156-B, CF/88).
3.2. Destino da arrecadação
Hoje: ISS e ICMS → receita para o Município/Estado de origem.
Novo modelo: IBS → receita para o Município/Estado de consumo.
👉 Isso significa: Municípios industriais podem perder receita; Municípios turísticos/consumidores podem ganhar.
4. Comparativo prático – Antes e Depois
Situação Regra Atual (ISS/ICMS)
Nova Regra (IBS)
Venda de mercadoria de SP para RJ Receita do ICMS fica com SP Receita do IBS vai para RJ
Serviço prestado por empresa local: Receita do ISS fica no Município do prestador Receita do IBS vai para o Município do tomador
Incentivos fiscais Municípios podem conceder benefícios no ISS
Incentivos ficam limitados, exigindo lei complementar nacional
5. Período de transição (arts. 118 a 120 da EC 132/23)
2026 a 2028: IBS e CBS cobrados em alíquotas reduzidas; ISS/ICMS ainda vigentes.
2029 a 2032: substituição gradual.
2033 em diante: somente IBS e CBS.
⚖️ Base legal: art. 119 da EC 132/23 – prevê regras de transição e compensação.
6. Governança – Comitê Gestor do IBS
Criado pelo art. 156-B da CF/88.
Composição: paritária entre Estados e Municípios.
Funções: arrecadar, administrar e distribuir a receita.
Limites: não pode fixar alíquotas nem legislar.
📌 Risco: redução da autonomia municipal.
📌 Solução: articulação política para garantir protagonismo no Comitê.
7. Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR)
Previsto pelo art. 159, §4º, CF/88.
Finalidade: reduzir desigualdades regionais e compensar perdas.
Fonte de recursos: parcela da arrecadação do IBS e CBS.
👉 Municípios devem preparar projetos de infraestrutura e desenvolvimento, para concorrer a esses recursos.
8. Reflexos diretos nos tributos municipais
8.1. ISS
Será substituído pelo IBS.
Municípios devem atualizar leis fiscais e treinar equipes.
8.2. IPTU (art. 156, §1º, III, CF/88, com EC 132/23)
Base de cálculo pode ser atualizada por decreto, desde que a lei municipal defina critérios.
Supera:
Súmula 160 do STJ → atualização só por lei.
Tema 211 do STF → vedação de decreto.
Possibilita maior autonomia e instrumentos como:
IPTU Verde (Curitiba),
IPTU Azul (gestão hídrica),
IPTU Amarelo (sustentabilidade urbana).
8.3. ITBI
Antecipação do fato gerador para a assinatura do contrato (não apenas o registro).
Possibilidade de pauta fiscal → maior arrecadação.
8.4. ITR
Pode ser municipalizado via convênio com RFB.
Estratégia importante para Municípios com forte zona rural.
9. Jurisprudência relevante
STF, RE 796.376/SC (Tema 796, repercussão geral) → ITBI só após registro da transmissão. Reforma abre espaço para revisão.
STF, RE 714.139 (Tema 745) → limites da competência municipal no IPTU progressivo.
STJ, Súmula 160 → atualização de IPTU só por lei → tendência de superação após EC 132/23.
TCE-SP, Acórdão TC-XXXXXX.989.22-2 → necessidade de lei municipal clara para progressividade de IPTU.
10. Estratégias práticas para os Municípios
📌 Checklist imediato
Criar grupo de trabalho interno sobre a Reforma.
Diagnóstico das receitas próprias (ISS, IPTU, ITBI, ITR).
Simulação de impacto da transição.
Revisão da legislação municipal do IPTU e ITBI.
Preparar adequação dos sistemas fiscais (NF nacional e CNPJ alfanumérico a partir de 2026).
Planejar diversificação econômica (turismo, serviços, comércio).
Elaborar projetos estruturados para captar recursos do FNDR.
Promover capacitação de servidores e contadores locais.
Participar ativamente da articulação junto ao Comitê Gestor.
Criar políticas de incentivo ao consumo local.
11. Modelos normativos sugeridos
Exemplo de dispositivo em lei municipal (IPTU):
“Art. XXX. A atualização da base de cálculo do IPTU poderá ser realizada anualmente por decreto do Poder Executivo, observados os critérios definidos nesta lei, com base na variação dos valores de mercado dos imóveis apurados por metodologia oficial, nos termos do art. 156, §1º, III, da Constituição Federal.”
12. Conclusão
A Reforma Tributária exige dos Municípios planejamento estratégico e ação imediata.
Quem se antecipar, revisando legislações, modernizando sistemas e fortalecendo a governança local, transformará desafios em oportunidades de desenvolvimento econômico e social.
A ACGP se coloca à disposição dos gestores municipais para apoiar diagnósticos, estudos de impacto, capacitação e adequações legislativas necessárias.
Mogi Mirim/SP – Setembro de 2025
Caroline Gualtieri e João Costa
Consultores ACGP
